24/03/2020
Atualizada: 24/03/2020 15:58:50


Após pressão dos governadores do Nordeste, o governo federal anunciou, dia 23/03, um pacote de R$ 88,2 bilhões que não passa, efetivamente, de R$ 10,0 bi, sendo R$ 8 bilhões para saúde e R$ 2,0 bilhões para proteção social através da promessa de acréscimo de 1.500 beneficiários ao Programa Bolsa-família (PBF). Aos estados e municípios que apresentarem problemas na arrecadação fiscal, a possibilidade de se complementar os fundos de participação a estados e municípios (FPE e FPM), no valor de R$ 16 bilhões. O restante é suspensão/reescalonamento de dívida e novos empréstimos bancários junto ao mercado financeiro.

Se o acordo for cumprido, a economia terá a chance de dar um passo à frente, dados dois pontos fundamentais, há muito tempo defendido pelo campo progressista: mecanismos de distribuição de renda para estimular o consumo e a elevação dos gastos governamentais. Ponto para os críticos ativistas políticos de plantão. Ainda assim, é importante compreender que o Nordeste responde por 28% da população brasileira e que R$ 26 bi em quatro meses, corresponderia a R$ 110,0 por pessoa/mês. Ajuda, mas não é suficiente.

Em fev/2020, com redução de 12% em relação a 2014, Alagoas registrou 386,7 mil beneficiários no Programa Bolsa Família (PBF), cobertura a 30% de sua população, com um valor médio de R$ 196,0 por família e repasse de R$ 75,8 milhões/mês. 558 mil famílias apresentam renda per capita de até ½ salário mínimo, metade da população do Estado em situação de pobreza e mais de 10% em situação de extrema pobreza.

Voltemos a atenção para os R$ 62,2 bilhões restantes desse pacote. R$ 12,6 bilhões correspondem à suspensão de dívidas dos estados para com a União, dando a estes um fôlego para elevação dos gastos emergenciais em um momento crítico de desidratação da economia nacional. O Estado de Alagoas, em parceria com o município de Maceió, poderia providenciar casas de acolhimento para mais de 1.50 moradores em situação de rua, com atividade de capacitação direcionadas à atividade laboral, além de escolas de tempo de integral para seus filhos. Se essa geração for salva das ruas e das drogas, poderá reescrever sua história rompendo com um passado de privações que fere a dignidade humana e os condena à morte até os 29 anos de idade, em média.

Os R$ 9,6 bilhões são dívidas de estados e municípios para com o mercado financeiro privado que, na melhor das hipóteses, poderão ser reescalonadas, jamais perdoadas. Em se tratando de mercado financeiro nacional, reescalonamento de dívida tem um custo muito elevado e deve ser recusado.

O mesmo raciocínio serve para R$ 40 bilhões disponibilizados para empréstimos. Se houver possibilidade de atravessar essa crise sem novos empréstimos, é prudente que sejam recusados. Endividamento de estados e municípios só interessa ao sistema financeiro e a quem vai deixar a dívida para outro gestor administrar. Cedo ou tarde, contribuinte vai pagar essa conta. Vale ressaltar que a dívida de estados e município não será perdoada e novos empréstimos elevariam o estoque da dívida que já compromete boa parte da arrecadação fiscal.

Para completar a generosidade do governo ao mercado financeiro, o Banco Central reduziu o percentual dos depósitos compulsórios de 25% para 17% sobre depósitos à vista, utilizados como mecanismo de controle da base monetária, a fim de moderar a capacidade de criação de moeda pelos bancos comerciais.

Traduzindo, isso aumenta de forma expressiva a capacidade de bancos elevarem sua rentabilidade a partir da elevação de sua capacidade de empréstimos. E adivinha quem está sendo estimulado a pegar esses empréstimos? Estados e municípios. Agora adivinha quem paga a conta de União, estados e municípios. Pois, nós contribuintes. Com você pode ver, no final das contas, é sempre o consumidor e a classe trabalhadora que bancam o total da fatura.

 

Fonte: Luciana Caetano - Professora da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Ufal

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